Eu sou professor (isso diz muita coisa sobre mim). Há alguém tempo venho procurando livros infanto juvenis buscando dentro deles historias que me sirvam para trabalhar nas aulas. Busquei especialmente as novas literaturas. Assim fui de encontro a livros muito comentados sobre o que seriam os gênios dessa literatura. Sujeitos como David Wallians (que escreveu ratobúrguer), que já tem diversos livros publicados. Encontrei também a série do Nate e por ultimo o Yoda de Origami. Outros livros vieram até mim, mas seria uma lista longa demais, então vou focar nesses.
Reparei algo de incomodo em todos esses livros: a retratação pejorativa de alguns personagens. Vamos entender primeiramente que os personagens desses livros são em sua maioria crianças. Quase sempre da faixa etária que o livro pretende atingir, e assim quase sempre são estudantes (mesmo que a historia não se passe na escola). A linguagem dos livros tem uma simplicidade para favorecer a leitura dos jovens, mas ela ultrapassa esse simplicidade e se vende ao humor barato quando comenta, com uma suposta mentalidade jovem, negativamente sobre personagens. Vemos por exemplo uma retratação negativa dos sujeitos gordos e ‘nerds’. O termo Mané ganha espaço e é possível até encontrar trechos de livros que digam que o ‘mané’ apanha de outros garotos por ser estranho, e que há culpa nele por isso. Acho que até aqui da pra entender o que eu quero dizer, não é? Vamos ver um trechinho de O Estranho Caso do Yoda de Origami:
....apesar de o Doug ser um bobão.
Isso não é um insulto. É só um fato. Parece que o Doug nunca faz nada certo. Está sempre se metendo em encrenca. Sempre sendo atormentado pelos outros garotos.
...Consegue até transformar suas características legais em características de mané.
Sabemos que muitas crianças e jovens reproduzem ideias preconceituosas. Sabemos que as piadinhas de sala de aula podem ultrapassar os limites do suportável e que a violência psicológica e física é muito comum no ambiente escolar. O jovem reproduz, normalmente, aquilo a que foi exposto. E provavelmente vai se identificar com o livro e se interessar por ele se tiver elementos comuns ao seu cotidiano. Seria então confortável ao jovem que bate no colega ‘mané’ encontrar uma história que justifica que a culpa é do Mané e não dele. A tão falada 'inversão de valores' é percebida nesse contexto. Colocar vitimas como culpadas pode ser cômodo pra muita gente, mas é um ato digno de repudio. É preciso deixar claro que essas situações não são o eixo da historia. Eles até poderiam passar despercebidas por um leitor adulto pouco interessado na formação dos sujeitos, o que não é meu caso. Essas introduções negativas dentro dos livros infantis ajudam a naturalizar na mente dos jovens ações preconceituosas.
E contrapartida a muitos outros livros bons que encontrei. Mas nenhum é daqueles de mais de cem páginas e com capa dura. Não são aclamados por ai. São livros simples, pequenos e de fácil leitura. São bons para trabalhar nos anos iniciais. Ideias pra 2° ou 3° ano/9. Livros pro 4° e 5° eu ainda não encontrei. Deveriam ser esses livros tão me divulgados pelas editoras, mas que na verdade são meros reprodutores de pensamentos deturpados. Não seria difícil adequar esses livros, como já disse antes os erros não estão no eixo da historia, são colocados lá como uma suposta maneira de se aproximar da linguagem e pensamentos dos jovens. Ter-se-ia duas opções: apenas retirar esses elementos e não deixar nada no lugar, ou retirá-los e acrescentar algo positivo que mostre que jovens também podem ter vindo de uma educação que valorize o respeito e a diversidade.
Tudo isso pode parecer tempestade em copo d’agua. Não é. Não pra mim. Eu já presencie diversas situações onde país empoe uma educação machista e ultra-preconceituosa sobre seus filhos. Já vi mesmo sujeitos que são profissionais da educação reproduzindo essas situações e vomitando preconceito e machismo. Um exemplo do risco de tudo isso sobre a formação das crianças é quando os pais falam “ se você apanhar na escola, vai apanhar em casa também”. Com isso se o filho não revidar a agressão recebida na escola ele não conseguira contar aos pais e possivelmente vai sofrer por toda a vida sem saber como reagir. Pessoas que dizem coisas assim para os filhos também dizem coisas assim em grupos de adultos “meu filho não vai ser um maricas”.
A construção de uma sociedade justa e que respeita a diversidade das pessoas depende da atenção aos detalhes.
Expressões Negativas da Nova Literatura Infanto-Juvenil
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Oleh
Professor Augusto Junior